O caçador


De acordo com os noticiários e suas matérias cotidianas de violência, é fato que tem havido um aumento constante de assaltos a clientes de bancos e lojas comerciais. A constância destes fatos, cada vez mais, geram pânico nos funcionários e incertezas nos clientes.

É tempo de se especular que: ou o nosso país está apresentando uma “epidemia” de pessoas que apresentam o Transtorno compulsivo de conduta (quando o individuo pratica ato delinquente que é de origem especificamente compulsiva), ou realmente, precisamos desejar muito que aconteça mudanças em nossas leis penais que endureçam as penas aplicadas. Talvez assim se possa coibir a malandragem descarada daqueles que não gostam de trabalhar e a cada dia que passa tomam conta das cidades. Não estou aqui incluindo, neste texto, os dependentes químicos, apenas aqueles que devido a percepção das facilidades, optam por ganhar a vida aplicando golpes.

Esclareço o desabafo relatando um fato que presenciei enquanto aguardava ser atendido no interior de um estabelecimento comercial.

Estava meio que irritado com a demora e meio que distraído pensando na vida, quando um cliente me despertou atenção. A forma como aparentava estar hipervigilante, ou seja, sua atenção parecia desviar a cada momento por qualquer estimulo periférico. Seria "um caçador"?- O famoso "olheiro" de quadrilha, como está na moda. - A sua indumentária, como um estereótipo, lembrava a piada do individuo que só põe gravata em dia de casamento, mas fica visivelmente fora do padrão. Com a chegada de uma senhora bem vestida, carregando a bolsa para trás e semi-aberta, o citado cliente, daquele momento em diante, se modificou. Pareceu que toda a concentração da sua atenção se voltou no sentindo de manter a bolsa da senhora numa posição focal. Era impressionante perceber a tenacidade de sua atenção no sentindo de vigilância do objeto em questão. Até que num determinado momento se deu conta de estar sendo observado. Pareceu oscilar. Moveu-se no sentindo de querer se afastar, porem hesitou. Ele colocou as mãos nos bolsos. Meio que virou o tronco para o lado como simulasse ir para longe. - Pela linguagem do corpo, para quem tem experiência profissional, pode-se perceber muitas coisas dos outros –.

Notei também as transformações que aconteciam em sua expressão. A principio evitou contato visual com os demais. Ficou assim por alguns segundos, de repente moveu-se na direção da senhora e de sua bolsa que a esta altura estava ainda mais escancarada. Ele então se voltou na direção dos demais e encarou. Suas fácies e postura corporal ereta eram aparentemente sem ansiedade. Certamente não se tratava do caso de ser um usuário de drogas, mas sim de um psicopata. Até aquele momento eu tinha estado completamente quieto. Não tinha trocado palavra com nenhum dos presentes. Éramos todos desconhecidos. Os dois homens ao meu lado claramente percebiam também o fato. Um era jovem e trocava olhares com o outro que era um senhor bem mais velho do que eu, e estava visivelmente indignado. Há esta altura, sua linguagem corporal era de luta. Percebi que ele ia acabar partindo para cima do cara. Imaginei o sujeito sacando uma arma. Num ato reflexo, postei-me a frente do senhor. Apontei discretamente para a câmara filmadora. Ele ficou parecendo meio perplexo. De repente o tal cliente foi chamado para ser atendido. Entregou um papel e saiu rapidamente O senhor ao meu lado comentou alguma coisa de que a câmara não estava funcionando ou que não servia para nada. Lembrei-me de todos os conceitos que já li sobre paranóia e tive vontade de rir. Precisei me esforçar para conseguir me conter e não falar nada.
Tenha sido o fato, um mero caso de histeria coletiva motivada por preconceito, ou que tenha sido a iminência de mais uma tragédia social a estampar manchetes, o fato serve para ilustrar a nossa necessidade premente de trabalhar no sentindo de conseguir mudanças culturais e no código penal.

1 Response to "O caçador"

  1. E incrível como a violência esta conseguindo nos mudar, talvez estejamos nos isolando tanto que isto esta nos unindo e fazendo a gente se interagir mais, nos protegermos, será que finalmente vamos começar a nos indignar?

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